Docente utiliza IA para diagnóstico da Covid-19
Pesquisa irá verificar a viabilidade de produzir roteiro de apoio no diagnóstico de pacientes
Quando a pandemia da Covid-19 chegou ao Brasil, Alexandra Aparecida de Souza, docente do curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas do Câmpus Guarulhos do IFSP, voltou seus estudos para a doença pouco conhecida no mundo. Mais de um ano depois e com duas publicações internacionais, elaatua em uma força-tarefa,juntocomdemais pesquisadorescolaboradores, para expandir o conhecimento adquirido incorporandonovas análises e ampliandoos estudos.


A expectativa é que esse trabalho,e outros que virão,possam contribuir para o estabelecimento de roteiros de apoioàtomada de decisões médicas não sóda Covid-19,mastambémdeoutras doenças,e oferecer a possibilidade deo paciente ser atendido mais prontamente em seu tratamentoem virtude do apoio em decisões de cunho diagnóstico.
Na Universidade Federal de São Paulo(Unifesp), instituição colaboradora, o docente Danilo Candido de Almeida trabalhavaem sua área de atuação,quando foi alertado pelaprofessoraAlexandra sobre a possibilidade de aplicar seus estudosemCiência daInformaçãocom algoritmos no diagnóstico da Covid-19. A pergunta inicial dos pesquisadores foi“Por meio daInteligência Artificial seria possível identificar variáveis em um banco de dados de hemogramas que poderiam facilitar a tomada de decisão no diagnóstico de admissão da Covid-19?”.
Devido à similaridade entre os sintomas do novo coronavírus e de uma gripe comum, a avaliação clínica feita por um médico muitas vezes não é capaz de certificaro diagnósticoda nova doença. Dessa maneira, são solicitados exames, como o PCR, considerado padrão ouro por oferecer100% de assertividade por meio da análise de material genético do vírus presentenas vias aéreasnos primeiros dias da infecção pela doença. “Enquanto o paciente aguarda o resultado, ele é acompanhado, de acordo com o seu estadoclínico,na enfermariaouUnidade de Terapia Intensiva (UTI)das unidades de saúde,porém em alas não exclusivas para Covid-19. A esperapelodiagnósticopode retardar a intervenção imediata no caso da Covid-19, podendo,nos casos mais graves,levarà falência renal e pulmonar edeoutros sistemas do organismo”, explica Danilo.
Agilizar o iníciodotratamento dos pacientes graves da Covid-19 seria fundamentalpara um bomprognoósticoclínico. Nesse sentido,em suas pesquisas,osdocentes visam ajudaro corpo médico dando apoioàtomada de decisõesno diagnóstico dadoençapor meio da Inteligência Artificial (IA). O objetivo é avaliar o hemograma dos pacientes(um exame rápido e de fácil acesso)e verificar possíveis alterações em variáveisespecificas que podem estar associadasàevolução para os estágios mais graves da doença.
Inteligência Artificial
Quando desenvolveu oestudo,Alexandra verificou que já existiam outraspesquisas em andamento, mas elas utilizam uma abordagem conhecida como “abordagem caixa preta”, que não permite ao usuário humano reconhecer ou interpretar com precisão a variável que influenciou no processo de tomada de decisão do algoritmodurante a sua predição.Para possibilitar ao usuário humano o entendimento de determinada decisão tomada pelo algoritmo, Alexandra optou por usar a Inteligência Artificial Explicável (XAI). A partir dessa abordagem, ela utilizouum método de mineração de dados que permite identificar o que se quer buscar. Para que o resultado da mineração de dados seja efetivo,é fundamental que se defina a priori perguntas que devem ser respondidas no final do processo. “No nosso caso,queríamos identificar quais as variáveis presentes nos exames laboratoriais rotineirosno ambiente de emergência médica, os hemogramas, possuíam padrões e comportamentos relevantes para detectar pacientes positivos para SARS-CoV-2", elucida.
O estudo realizado pelaAlexandrautilizouumbanco dedados públicos do Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo. Danilo enfatiza que a nova doença gerou bancos de dados clínicos enormes, nunca vistosantes. No banco de dados doAlbert Einstein,estão disponíveis 5.644 exames de pacientes que deram entrada na unidade entre março e abrilde 2020.Para atender à necessidade de informação demandada para a IA, 14 variáveis foram selecionadas devido à sua presença frequente nos hemogramas. Nessa análise, Alexandra trabalhou com um algoritmochamado SOM (Mapa Auto Organizável), “que é um tipo de redeneural artificial com aprendizado não supervisionado. Ele permite interpretar a decisão tomada na hora de fazer o agrupamento dos dados”, explana a docente.
Os padrões observados nesses agrupamentos renderam algumas descobertas,como o peso de certas variáveis (RDW, Basófilos, Leucócitos e Eosinófilos) no agrupamento de pacientes SARS-CoV-2positivo.Os pesquisadores ressaltam que algumas dessas variáveis como RDW e Leucócitos já foram associados na literatura com maior mortalidade e mauprognóstico na Covid-19. Danilo e Alexandra acreditam que se o paciente chega a uma unidade de pronto atendimento com sintomas clássicos do novo coronavíruse,ao mesmo tempo após a admissão,apresentar essas mesmas variáveis alteradas, esses pacientes têm grandes chances de estarem contaminados com o novo coronavírus SARS-CoV-2. Em contrapartida, como essas variáveis também estão associadas a outras complicações clínicas severas (SEPSE, doença renal aguda, pneumonias),independentementeda Covid-19, elas podem também ser usadas como apoio para o adiantamento do tratamento ao paciente.
Em uma situação hipotética, se comprovadoo apoio ao diagnóstico“enquanto aguarda o resultado do PCR”,omédicopoderiaencaminhar o pacientecom sintomas gravesdiretopara aUTIda ala do COVID-19,umavez que verificasse alteraçõesexpressivas nessasvariáveis correlacionadasno estudo. Daniloressalta que essaavaliação do hemograma não anula a necessidade de realizar o PCR. “O mais relevante é que esse paciente tenha um tratamento mais intensivo desde o início. Queremos que os profissionais da saúdetenham subsídios paraolharemcom mais atenção o hemogramana hora detratar os pacientes com sintomas da Covid-19", aponta.
ʳܲçã
O resultado da pesquisa foidivulgado emuma publicação internacionalnomêsde fevereiro: .A publicaçãofoiassinada por Alexandra, Daniloe outroscolaboradores.
Eles explicam quedevido à demora no processo de publicação, nesse período, outras publicações demonstraram que as variáveis identificadasno estudopor elespossuem relações com mortalidade e piora da doença, ou seja, “nossa pesquisa foivalidadaporestudos que já haviam sido feitos”, afirmam.
No momento,o algoritmoestá sendo aplicadoem uma base de dados maior para confirmar tudo o que já foi descoberto. “Se der certo,podemos estabelecerumroteiro de apoio a tomadas de decisões,incentivandoaatençãoadados do hemograma no contexto da Covid-19,e encaminhá-loàs unidades de saúde,para que sejaavaliado e julgado pela equipe médica de atendimento”, elucida Danilo.
Os estudos atuais fazem parte da pesquisa de pós-doutorado de Alexandra desenvolvido na Universidade Mackenzie,sobsupervisãododocenteLeandroAugustodaSilva.
A metodologia desenvolvida porAlexandra e Danilo também já está sendo aplicada em outros estudos para a identificaçãode possíveis variáveis/problemas que possam ser usados no auxílio em decisões médicasparaoutras doenças com outrascomplicações.“A Inteligência Artificial está nos mostrando coisas que ficam escondidas num montante de informações”, finaliza Alexandra.
Redes Sociais